23/03/2009

Reflexões do Professor Medina Carreira

O texto é longo,mas vale a pena ler... e ajuizar!

Reflexões do Professor Medina Carreira

Nota: O Professor Medina Carreira, um dos mais capacitados economistas
portugueses, sempre que fala, deixa o País a reflectir, estupefacto.
Aqui deixamos a síntese de uma das últimas entrevistas que concedeu e a não
perder.

"Vocês, comunicação social, o que dão é esta conversa de «inflação menos 1
ponto», o «crescimento 0,1 em vez de 0,6»....Se as pessoas soubessem o que é
0,1 de crescimento, que é um café por português de 3 em 3 dias...
Portanto andamos a discutir um café de 3 em 3 dias...mas é sem açúcar..."

"Eu não sou candidato a nada, e por conseguinte não quero ser popular.
Eu não quero é enganar os portugueses. Nem digo mal por prazer, nem quero
ser «popularuxo» porque não dependo do aparelho político!"

"Ainda ?há dias eu estava num supermercado, numa bicha para pagar, e estava
uma rapariga de umbigo de fora com umas garrafas, e em vez de multiplicar
«6x3=18», contava com os dedos: 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7... Isto não é ensino...é
falta de ensino, é uma treta! É o futuro que está em causa!"

"Os números são fatais. Dos números ninguém se livra, mesmo que não goste.
Uma economia que em cada 3 anos dos últimos 27, cresceu 1% em 2...esta
economia não resiste num país europeu."

"Quem anda a viver da política para tratar da sua vida, não se pode esperar
coisa nenhuma. A causa pública exige entrega e desinteresse."

"Se nós já estamos ultra-endividados, faz algum sentido ir gastar este
dinheiro todo em coisas que não são estritamente indispensáveis?
P'ra gente ir para o Porto ou para Badajoz mais depressa 20 minutos?
Acha que sim?
A aviação está a sofrer uma reconversão, vamos agora fazer um aeroporto,
se calhar não era melhor aproveitar a Portela?
Quer dizer, isto está tudo louco?"

"Eu por mim estou convencido que não se faz nada para pôr a Justiça a
funcionar porque a classe política tem medo de ser apanhada na rede da
Justiça. É uma desconfiança que eu tenho. E então, quanto mais complicado
aquilo for..."

"Nós tivemos nos últimos 10-12 anos 4 Primeiros-Ministros:
-Um desapareceu;
-O outro arranjou um melhor emprego em Bruxelas, foi-se embora;
-O outro foi mandado embora pelo Presidente da República;
-E este coitado, anda a ver se consegue chegar ao fim e fazer alguma
coisa..."

"O João Cravinho tentou resolver o problema da corrupção em Portugal.
Tentou. Foi "exilado" para Londres. O Carrilho também falava um bocado, foi
para Paris. O Alegre depois não sei para onde ele irá...
Em Portugal quem fala contra a corrupção ou é mandado para um "exílio
dourado", ou então é entupido e cercado."

"Mas você acredita nesse «considerado bem»?
Então, o meu amigo encomenda aí uma ponte que é orçamentada para 100 e
depois custa 400? Não há uma obra que não custe 3 ou 4 vezes mais? Não acha
que isto é um saque dos dinheiros públicos? E não vejo intervenção da
polícia...
Há-de acreditar que há muita gente que fica com a grande parte da
diferença!"

"De acordo com as circunstâncias previstas, nós por volta de 2020 somos o
país mais pobre da União Europeia. É claro que vamos ter o nome de Lisboa na
estratégia, e vamos ter ,eventualmente, o nome de Lisboa no tratado.
É, mas não passa disso. É só para entreter a gente..."

"Isto é um circo. É uma palhaçada. Nas eleições, uns não sabem o que estão a
prometer, e outros são declaradamente uns mentirosos:
-Prometem aquilo que sabem que não podem."

"A educação em Portugal é um crime de «lesa-juventude»:
Com a fantasia do ensino dito «inclusivo», têm lá uma data de gente que não
quer estudar, que não faz nada, não fará nada, nem deixa ninguém estudar.
Para que é que serve estar lá gente que não quer estudar?
Claro que o pessoal que não quer estudar está lá a atrapalhar a vida aqueles
que querem estudar. Mas é inclusiva.... O que é inclusiva? É para formar
tontos? Analfabetos?"

"Os exames são uma vergonha. Você acredita que num ano a média de Matemática
é 10, e no outro ano é 14? Acha que o pessoal melhorou desta maneira? Por
conseguinte a única coisa que posso dizer é que é mentira!
Está-se a levar a juventude para um beco sem saída. Esta juventude vai ser
completamente desgraçada! "

"A minha opinião desde há muito tempo é TGV- Não!
Para um país com este tamanho é uma tontice.
O aeroporto depende. Eu acho que é de pensar duas vezes esse problema.
Ainda mais agora com o problema do petróleo.
"Bragança não pode ficar fora da rede de auto-estradas? Não?
Quer dizer, Bragança fica dentro da rede de auto-estradas e nós ficamos
encalacrados no estrangeiro? Eu nem comento essa afirmação que é para não ir
mais longe...
Bragança com uma boa estrada fica muito bem ligada.
Quem tem interesse que se façam estas obras é o Governo Português, são os
partidos do poder, são os bancos, são os construtores, são os vendedores de
maquinaria...Esses é que têm interesse, não é o Português!"

"Nós em Portugal sabemos resolver o problema dos outros:
A guerra do Iraque, do Afeganistão, se o Presidente havia de ter sido o
Bush, mas não sabemos resolver os nossos. As nossas grandes personalidades
em Portugal falam de tudo no estrangeiro: criticam, promovem, conferenciam,
discutem, mas se lhes perguntar o que é que se devia fazer em Portugal
nenhum sabe. Somos um país de papagaios...

Receber os prisioneiros de Guantanamo?
«Isso fica bem e a alimentação não deve ser cara...»
Saibamos olhar para os nossos problemas e resolve-los e deixemos lá os
outros...
Isso é um sintoma de inferioridade que a gente tem, estar sempre a olhar
para os outros. Olhemos para nós!"

"A crise internacional é realmente um problema grave, para 1-2 anos.
Quando passar lá fora, a crise passará cá.
Mas quando essa crise passar cá, nós ficamos outra vez com os nossos
problemas, com a nossa crise.
Portanto é importante não embebedar o pessoal com a ideia de que isto é a
maldita crise. Não é!"

"Nós estamos com um endividamento diário nos últimos 3 anos correspondente a
48 milhões de euros por dia:
Por hora são 2 milhões! Portanto, quando acabarmos este programa Portugal
deve mais 2 milhões! Quem é que vai pagar?"

"Isso era o que deveríamos ter em grande quantidade. Era vender sapatos. Mas
nós não estamos a falar de vender sapatos. Nós estamos a falar de pedir
dinheiro emprestado lá fora, pô-lo a circular, o pessoal come e bebe, e
depois ele sai logo a seguir..."

"Ouça, eu não ligo importância a esses documentos aprovados na
Assembleia...Não me fale da Assembleia, isso é uma provocação...
Poupe-me a esse espectáculo...."

"Isto da avaliação dos professores não é começar por lado nenhum. Eu já
disse à Ministra uma vez «A senhora tem uma agenda errada"» Porque sem pôr
disciplina na escola, não lhe interessa os professores. Quer grandes
professores? Eu também, agora, para quê?
Chegam lá os meninos fazem o que lhes dá na cabeça, insultam, batem, partem
a carteira e não acontece coisa nenhuma. Vale a pena ter lá o grande
professor? Ele não está para aturar aquilo...
Portanto tem que haver uma agenda para a Educação. Eu sou contra a autonomia
das escolas. Isso é descentralizar a «bandalheira»."

"Há dias circulava na Internet uma notícia sobre um atleta olímpico que
andou numa "nova oportunidade" uns meses, fez o 12ºano e agora vai seguir
Medicina... Quer dizer, o homem andava aí distraído, disseram «meta-se nas
novas oportunidades» e agora entra em Medicina...
Bem, quando ele acabar o curso já eu não devo cá andar felizmente, mas quem
vai apanhar esse atleta olímpico com este tipo de preparação...
Quer dizer, isto é tudo uma trafulhice..."

"É preciso que alguém diga aos portugueses o caminho que este país está a
levar.
Um país que empobrece, que se torna cada vez mais desigual, em que as
desigualdades não têm fundamento, a maior parte delas são desigualdades
ilegítimas para não dizer mais, numa sociedade onde uns empobrecem sem
justificação e outros se tornam multi-milionários sem justificação, é um
caldo de cultura que pode acabar muito mal. Eu receio mesmo que acabe."

"Até hà cerca de um ano eu pensava que íamos ficar irremediavelmente mais
pobres, mas aqui quentinhos, pacíficos, amiguinhos, a passar a mão uns pelos
outros...
Começo a pensar que vamos empobrecer, mas com barulho...
Hoje, acrescento-lhe só o «muito».
Digo-lhe que a gente vai empobrecer, provavelmente com muito barulho...
Eu achava que não havia «barulho», depois achava que ia haver «barulho», e
agora acho que vai haver «muito barulho».
Os portugueses que interpretem o que quiserem..."

"Quando sobe a linha de desenvolvimento da União Europeia sobe a linha de
Portugal. Por conseguinte quando os Governos dizem que estão a fazer coisas
e que a economia está a responder, é mentira!
Portanto, nós na conjuntura de médio prazo e curto prazo não fazemos coisa
nenhuma. Os governos não fazem nada que seja útil ou que seja excessivamente
útil. É só conversa e portanto, não acreditem...
No longo prazo, também não fizemos nada para o resolver e esta é que é a
angústia da economia portuguesa."

"Tudo se resume a sacar dinheiro de qualquer sítio. Esta
interpenetração do político com o económico, das empresas que vão buscar os
políticos, dos políticos que vão buscar as empresas...
Isto não é um problema de regras, é um problema das pessoas em si...
Porque é que se vai buscar políticos para as empresas?
É o sistema, é a (des)educação que a gente tem para a vida política...
Um político é um político. E um empresário é um empresário. E não deve haver
confusões entre uma coisa e outra. Cada um no seu sítio.
Esta coisa de ser político, depois ministro, depois sai, vai para ali,
tira-se de acolá, volta-se para ministro...é tudo uma sujeira que não dá
saúde nenhuma à sociedade."

"Este país não vai de habilidades nem de espectáculos. Este país vai de
seriedade. Enquanto tivermos ministros a verificar preços e a distribuir
computadores, eles não são ministros! Eles não são pagos nem escolhidos para
isso! Eles têm outras competências e têm que perceber quais os grandes
problemas do país!"

"Se aparece aqui uma pessoa para falar verdade, os vossos comentadores dizem
«este tipo é chato, é pessimista»....
Se vem aqui outro trafulha a dizer umas aldrabices fica tudo satisfeito...
Vocês têm que arranjar um programa onde as pessoas venham à vontade, sem
estarem a ser pressionadas, sossegadamente dizer aquilo que pensam. E os
portugueses se quiserem ouvir, ouvem. E eles vão ouvir,
porque no dia em que começarem a ouvir gente séria e que não diz aldrabices,
param para ouvir. O Português está farto de ser enganado!
Todos os dias tem a sensação que é enganado!"*

1 comentário:

Noélia de Santa Rosa disse...

Eu não tenho a sensação de estar a ser enganada.
Eu sei que estou a ser enganada.
Há mais de 30 anos que estou a ser enganada,
Já o era no tempo do Salazar e ainda o sou hoje.

O que o País precisa é de gente que tenha pudor e amor à coisa pública.

Brio profissional e vergonha na cara.

Gente que sirva o País e não que se sirva do País.

O que é que este País produz?

Tudo o que comemos importamos.
Tornámo-nos num País de Serviços e Serviços não produzem nada, apenas servem.

Esta é a base de toda e qualquer economia: produção e independência económica.

Gostei do artigo e vou ler com mais calma o teu blog.

Beijos